16 de junho de 2003

HORA DO CONTO-1

A LESBICA E O CARECA

Era uma vez uma lésbica que resolveu fazer um duo musical com um careca. O careca disse que sim porque já tinha emborcado três copos de gin revoltante, de marca impronunciável. E também porque a namorada o tinha deixado naquela mesma tarde e tudo nele, a começar pelo fígado, lhe pedia vingança. O corpo magro e com discretíssima penugem no peito fervia pela revanche e a proposta, encarnada no corpo e boca da mulher, caiu-lhe tão bem como uma mão amiga na testa de quem vomita.
- Vamos mostrar a estes cabrões quem é que é bom- disse ela.
Ele assentiu com a cabeça entontecida, mesmo se não sabia quem eram os cabrões nem como é que se operacionalizaria a coisa.
- Bora fazer um duo musical. Uma boys-band.
Nesta altura, ele teve discernimento para objectar que um gajo de 38 anos e uma mulher de 32 dificilmente seriam convincentes nesse papel.
Mas Júlia não era flor que se detivesse com estas questões menores. Num gesto, transpôs a vedação do problema.
- Pá... Um duo, então. Uma coisa que dê nas vistas.
E assim foi. Júlia atirou-se à guitarra e Martantónio à gaveta, de onde desencantou uns poemas que tinha escrito aos 16 anos para uma namorada coxa. Era uma coisa acerca da vitória da alma sobre a efemeridade do corpo. Uma treta que ele tinha inventado, à base de metáforas automobilísticas. Falava das desvantagens dos porshes (caros e pouco fiáveis) face aos wolkswagens que duravam uma vida. O tempo de um amor, portanto. Na verdade, o que se tinha passado era que ele estava podre de fome e timidez. Não conseguia fazer-se ouvir pelas boas de corpo, então vá de atacar a deficiente. Martantónio metera nos cornos que tinha que comer a estúpida da coxa. E mesmo a questão de como é que lhe havia de retirar as calças, sem desmontar a armação de metal que lhe segurava a anca, lhe parecia uma coisa de somenos importância.
(continua...)

Sem comentários: